terça-feira, 13 de maio de 2014

A TRAGÉDIA ENXADRÍSTICA

A TRAGÉDIA ENXADRÍSTICA

Realizar uma boa partida de xadrez, conquistando uma vitória, e perceber depois de analisá-la as falhas cometidas é uma das tragédias da alma enxadrística. É destruidora principalmente quando se reconhece que essa partida é a melhor que se podia fazer. Entretanto, ao disputar uma partida é saber antecipadamente que ela tem que ser imperfeita e com falhas; ao enfrentar um adversário em uma competição e jogá-la percebendo que ela é defeituosa e falha, isto é o máximo da tortura e da humilhação do espírito enxadrístico. Não só as partidas que jogo sinto que não me satisfazem, mas sei que as partidas que estou para disputar não me satisfarão, também. Sei tanto instintivamente, como doutrina filosófica, por um pressentimento obscuro.

Por que jogo xadrez então? Porque, especialista que sou da arte enxadrística, não aprendi a compreendê-la plenamente. Não aprendi a abdicar da tendência para o jogo romântico, tático e superficial. Tenho que jogar como cumprimento de uma punição. E o maior castigo é o de saber que o que jogo resulta inteiramente pueril, defeituoso e incerto.


Na minha juventude jogava partidas românticas. Logo, praticava um péssimo xadrez, mas julgava-o perfeito. Nunca mais tornarei a ter o falso prazer de produzir uma partida perfeita. O que jogo hoje é muito melhor. É melhor, mesmo, do que poderiam jogar os melhores mestres. Mas está infinitamente abaixo daquilo que eu, não sei por que, sinto que podia, ou talvez seja, que devia, jogar. Hoje termino em pranto revendo as minhas partidas da juventude, como a derradeira esperança perdida.